Muita gente tem me perguntado a quantas anda a campanha pela independência da Escócia.
Se o desenrolar atrapalhado do Brexit serviu de faísca para acender a campanha pela independência na Escócia, a epidemia atual foi como um balde de água fria. O coronavírus não só interrompeu o movimento independentista (fica inviável organizar “marchas”, encontros e demonstrações) como tornou sua discussão irrelevante no momento. O futuro de uma Escócia independente parece agora cada vez mais incerto e mais complicado, tanto na esfera nacional como na internacional.
Os governos adotaram uma abordagem colaborativa da crise, mas com suficiente liberdade para divergir em alguns aspectos. Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte impuseram medidas mais duras de contenção da epidemia, e em nenhum momento esta autonomia foi questionada. Ao mesmo tempo, a escala conjunta da intervenção social e econômica atual é inédita na história da nação britânica, e demonstra uma força difícil de ignorar. Nada testa sistemas políticos como um desastre. E o trabalho conjunto dos governos dos diferentes países da União demonstra que os mecanismos constitucionais ainda são suficientemente firmes.
O NHS, o sistema público de saúde, que tem sido usado por muito tempo para ancorar a unidade britânica, é agora mais importante do que nunca. Os aplausos de quinta-feira à noite, que acontecem de Plymouth a Lerwick, não têm fronteiras nacionais. Não são aplausos de escoceses para escoceses ou de ingleses para ingleses. São aplausos de britânicos para britânicos. Nada une um povo como uma calamidade. Quando a Rainha, em sua fala, lembrou as guerras mundiais, o sentimento invocado pelos escoceses não foi de separação, mas da lembrança de uma nação que sofreu unida e venceu unida.
Se, antes, as pesquisas já apontavam um empate técnico entre o “Sim” e o “Não” para a independência, tudo indica que a pequena margem, tão comemorada meses antes da epidemia, vá desaparecer. Não existem pesquisas no momento, mas fica difícil pensar que, depois de tudo isso – Brexit, coronavírus, desemprego aos milhões, negócios falindo, PIB em queda e dívidas nas alturas, os escoceses vão achar que vale a pena acrescentar mais um nível de dificuldade em suas vidas.
Para além disso, há a questão incerta da esfera internacional. A campanha da independência sempre se pautou na possibilidade de que, uma vez ‘livre’ do Reino Unido, a Escócia poderia se integrar à União Europeia, e buscar outros acordos internacionais de livre comércio. Mas o movimento previsto para o futuro, como consequência deste surreal 2020, é de maior fechamento. A crise anda sacudindo as bases da União Europeia, que terá pela frente o desafio imenso de provar sua força e sua relevância, enquanto crescem os movimentos nacionalistas em países-membros. Não é o momento de a UE abrir um precedente para aceitar a Escócia, às custas de comprar uma briga com a Espanha, por exemplo, que é um país mais forte. Entre as opções de ficarem sozinhos ou continuarem fazendo parte do Reino Unido, a maioria dos escoceses seguramente optaria por manter as coisas como estão.
Claro que, quando tudo isso acabar, argumentos políticos voltarão à tona, e as probabilidades de independência voltarão a ser calculadas e propagandeadas. Mas, no momento (e acredito que este momento seja bastante duradouro), o nacionalismo escocês provavelmente recuará perante a urgência de normalidade e estabilidade.
Marcelo
Olá Anelise, eu imaginava que a quarentena esfriaria sim o movimento, e também sempre tive as minhas dúvidas se valeria a pena a briga. Mesmo que a Escócia consiga sair do bloco, dificilmente ela conseguirá entrar para a UE e ainda teria que criar acordos comerciais próprios. Embora eu entenda a decepção da Escócia com o Brexit, eu acredito que a independência custaria “caro” demais, sem um retorno claro e efetivo.
Anelise
Oi Marcelo, concordo com você, seria sim bastante custoso e levaria um bom tempo para que tudo se ajustasse. É impossível prever que tipos de acordos a Escócia, como país independente, conseguiria fechar, e a União Europeia nunca deu nenhum tipo de garantia. Vamos ver o que dizem as próximas pesquisas, mas acredito que a maioria dos escoceses pesa tudo isso e prefere não criar mais instabilidade ainda. Talvez, quando a onda do Brexit acalmar, e a economia se recuperar, a causa retorne com mais força. Por enquanto, não vai conseguir ir muito longe.
Ana
Muito legal este post!!
Acho que a situação atual está mais para união do que para separação.
Escocia vai ter que esperar mais…